quarta-feira, 2 de maio de 2012

28.04.2012 – Rishikesh

Acordei tarde, saí e vi que Inci já havia saído, sabia que suas aulas de yoga eram 5 da manhã mas que voltava no máximo ás 7, mas como eram quase 10 logico que ela não ficaria esperando a Bela Adormecida. Então deixei um recado com o Kurmar (dono do hotel) e fui na agência próxima usar a internet e perguntar sobre o ônibus para Dhramsala, chegando lá e de cara a má noticia... “eu vi para você o ônibus para Dharamsala mas está esgotado, só tem em 2 de Maio” pôôô de novo essa m... de problema com passagens, para mim até que tudo bem pois estava curtindo estar ali, gostaria sim de ficar mais um pouco mas 2 de Maio era muito tempo então mais uma vez deixei para depois e fui caçar a Inci para conversar com ela sobre isso, porque eu poderia ficar mais certamente porque ali eu tinha paz e tinha uma pessoa querida, mas tinha que ver se era reciproco esse sentimento, e putz fui no Coffe Day e falei com o Robert que falou que ela tinha me procurado por ali, continuei circulando até que ela me achou! Ufa, eram quase meio-dia conversamos um pouco e percebi que o humor dela não estava dos melhores, expliquei ou melhor tentei explicar o que se passava pela minha cabeça e não tive a melhor das respostas, ela meio que respondeu secamente “não, você não me atrapalha, se por exemplo eu quiser ler um livro, eu vou ler o meu livro, faça o que for melhor para você”... ops... fiquei mordido na hora e decidi em pensamento “ahhhh quer saber de uma coisa, vou para Haridwar esta noite pego o trem amanhã cedo (lembrando que eu tinha passagens compradas) espero em Delhi o dia todo e me mando para Dharamsala, não vou ficar aqui aguentando rabugice de ninguém”.
E comuniquei o que iria fazer, ela permaneceu impassível; fomos em sua agência e o trem que ela queria para Varanasi estava lotado, aí o mau humor foi á mil. Aí, eu também fiquei muito mau-humorado quando o cara da agência dela não me deu atenção para ficar conversando sobre onde ela mora, onde ela estuda, e bla bla bla e depois que ela foi usar a internet o cara me deixou plantado ali para falar com um amigo... ah eu levantei bufando e só comuniquei que estava voltando ao hotel.
Voltei, depois fui rodar por outros cantos da cidade, fui na minha agência novamente perguntando sobre uma nova forma de ir (pegando o ônibus em Dehra-Dun de onde saiam 2 por dia), resolvi atravessar a ponte para saber até que horas haviam Vikrans (um tuk-tuk maior) para Haridwar (até as 22:00) e pronto era isso que eu faria.
A minha cabeça estava á mil, cheguei novamente no hotel e encontrei com Inci que me perguntou se eu queria ir almoçar, e respondi que sim e lá fomos nós. Fomos no restaurante italiano e comi uma lasagna (não esqueçam que aqui não tem carne) enquanto ela saboreava frituras vegetarianas. Conversamos assuntos mais leves porque se algum vez eu tocava em um assunto mais sério como por exemplo um ponto de vista já era motivo para discutirmos, ou seja, era melhor falarmos de coisas amenas.
Tudo isso eu entendo que é uma questão cultural, afinal nós latinos no geral somos mais sentimentais, turcos também são mas de uma forma mais dura. Mas naquele momento em que as coisas caminhavam em corda bamba, de novo fiquei puto quando ela acabou e se levantou e foi olhar uma loja que havia no fundo do restaurante. Entendem o que quero dizer com questão cultural? Na Turquia pode ser comum, mas para nós quando temos de levantar de uma mesa antes da outra pessoa terminar pedimos desculpas mil vezes, e como tudo estava meio nebuloso, ali mais uma vez me irritei mas não demonstrei, paguei a conta e disse que estava voltando ao hotel.
No caminho, fiquei pensando sobre ir naquela noite, eu não queria ir daquele jeito e também não queria andar mais Sleeper na India (as duas pernas da viagem até Dharamsala eram Sleeper). Assim meus planos mudaram pela 569ª vez naquele dia, no hotel relaxei e do nada apareceu o Kurmar (o dono do hotel) enfincou os dois polegares nos meus ouvidos enquanto os indicadores pressionavam os meus olhos e assim fiquei por uns 3 minutos que demoraram uma eternidade em outra dimensão kkkk mas ao mesmo tempo, quanta clareza; eu que vivia repetindo “vou para Dharamsala porque lá vou encontrar paz” voltei a entender naquele momento que a paz não é um lugar, a paz têm de estar em você, e partir daquele momento, depois que Kurmar se foi , eu fiquei com lágrimas nos olhos olhando para mim e procurando buscar essa paz no espirito.
Depois de um tempo tomei uma ducha, botei uma camiseta limpa e bonita por volta das 19:00 fui na cerimonia (que já devia estar acabando) atrás da Inci, mas com o coração em paz. Cheguei pelo alto e estava sentada no mesmo lugar do dia anterior e percebi que ela percorria a vista entre as pessoas como que procurando, ela fez isso umas 2 vezes enquanto estive ali, mas como estava fora do seu campo de visão procurei outro lugar.
Encostei ali, e logo fui recebido a distância com um largo sorriso, o qual retribuí da mesma forma, em cinco minutos a cerimonia acabou e nos encontramos a beira do rio, ficamos um pouco sentado ali e falamos “vamos para o Coffe Day? Nosso amigo deve estar lá!” E rumamos pelas ruas de Rishikesh desviando das mini-vacas, das motos, da bosta das vacas, das poças até estarmos no nosso conforto ocidental, logo o Robert chegou e ficamos ali por quase 3h batendo papo e comendo, muito! Fiquei empanturrado e na volta vim pensando em que já era a opção garantida de ir para Dharamsala de trem e que no hotel não tinha privaaaaaada... ferrou!
No hotel, chegamos e ficamos conversando com 3 universitarios indianos até altas horas, um deles me contou sobre que eles recebiam o equivalente á 25 reais por mês para estudar engenharia elétrica e quando contei o meu salario em dólar para ele, o queixo dele caiu para os valores indianos o que eu ganho é muito bom, mas expliquei que no Brasil era bom, mas longe de ser ótimo. Caras muitos amistosos, dei dicas sobre o Brasil e falei e porque não tentarem emprego em terras tupiniquins porque muitos setores faltavam mão de obra qualificada.
Enquanto fiquei ali conversando com eles aquela sensação de “cadê a privada?” foi aumentando mas me controlei e logo cada um foi para o seu quarto, dei “boa noite” á Inci e me recolhi aos meus aposentos.

27.04.2012 – Rishikesh

Antes do amanhecer estávamos todos acordados e por volta das 4 da matina, o trem finalmente chegou em Haridwar assim encerrando a pior viagem de trem que já fiz na vida hehehe mas a mais louca também!
Eu e Inci saímos da estação a procura de taxi e em um posto policial, Inci se informou e garantimos o nosso taxi para Rishikesh, e assim atravessamos o momento mais escuro da noite pelas estradas que levavam á saudosa Rishikesh.
Um pouco sobre esta cidade, ela está a beira do Ghanges (porém a cidade está fixada no local em que o rio sai das montanhas, então sua água é límpida e geladíssima), e ela é um centro espiritual onde se concentram muitos gurus e ashrams além de ser a capital mundial do yoga. Ficou mundialmente famosa, quando os Beatles nos anos 60 no auge do sucesso deram uma pausa na carreira e se instalaram em um ashram na cidade, junto ao quarteto ainda tinha artistas do quilate de Brian Wilson (vocalista dos Beach Boys) e Mia Farrow (aquela atriz que foi casada com o Woody Allen) e após esta experiência “transcendental” por aqui o estilo rítmico do grupo inglês mudou e logo veio o álbum Sgt Peppers considerado pela maioria dos críticos como o álbum mais importante da história do rock.
Enfim... Rishikesh! O taxi nos deixou em uma ruela e nos indicou a direção por onde deveríamos caminhar até a ponte, e no limiar da primeira luz do dia, fomos andando até chegar a esta ponte. Inci, que é praticante de yoga procuraria mais tarde um ashram para se hospedar e a principio gostaríamos apenas de um hotel para descansar.
Atravessamos as pontes e andamos pelas ruas ainda escuras da cidade, buscando nos orientar pois sabíamos que estávamos na região dos ashrams da cidade mas agora precisávamos era de uma guesthouse, nesse caminho achamos uma placa e assim fomos seguindo e já era praticamente dia quando chegamos na porta de um local chamado Pink Guest House, perguntamos o preço e só com um OK nos dirigimos á quarto que dividimos.
Dormimos cerca de 4h e logo acordamos para caçar ashrams e hotéis. E assim saímos na pernada, na luz do dia, que diferença! Rishikesh têm uma alma própria e um espirito vibrante, mais tarde volta a comentar sobre isso. Voltando á caça aos ashrams para Inci passamos em uns 3, inclusive um que é magnifico e todos LOTADOS. Ok, agora caiu a ficha e que você pode estar se perguntando “o que cargas d’água é um bendito ‘ashram’?”, mas suas duvidas acabaram porque eeeeeeu te explico.
Um ashram é uma mistura de templo, pensão, pousada e escola de yoga. Imagine um enorme jardim com quartos voltados para eles, é um local para peregrinos (independente da nacionalidade, estudarem o hinduísmo, a arte do yoga, meditarem e fazerem amizade com outros peregrinos ou se trancarem em seus quartos evitando contato com o mundo externo em busca de si mesmo. Cito duas referências ocidentais onde vocês podem ver, uma é o filme Comer, Rezar e Amar na parte em que a Julia Roberts vai para a India ela justamente vai para um ashram. E a outra referência é apenas simbólica, é musica “Dear Prudence” dos Beatles composta por John Lennon em Rishikesh em que ele convida Prudence Farrow (irmã da Mia) á sair do quarto e ver o sol brilhando do lado de fora além de seus amigos, pois a mesma só ficava enfurnada em seu quarto meditando.
Enquanto procurávamos paramos em um lugar próximo ao rio onde estava rolando uma cerimonia hindu, entramos eu fiquei lá para trás pois estava ali á titulo de curiosidade, Inci foi lá para frente (o lugar era dividido entre homens e mulheres); enquanto tocavam as musicas de celebração, o povo mais jovem saia dançando igualzinho ao Tony Ramos na novela Caminho das Indias, muito shooooow! E os caras jogavam os ombros, a mulherada também, faziam uma grande roda lá perto do palco e ficavam muito tempo dançando, mas quando acabou a parte musica e o cara começou a falar, a Inci olhou lá da frente para mim e chamei-a para sair.
Do lado de fora, Inci falou “ok, sem ashram, vamos procurar uma guest house barata para a gente ficar???” e eu claro, estava curtindo muito a companhia dela, inclusive agora falando sobre ela dá uma saudade enorme, e ao voltarmos á Pink descobrimos que ao lado ficava a pousada que ela tinha como referência. Ahhhpegamos nossas coisas e nos mandamos para lá, era sim o pior hotel que eu ficaria até esse momento, mas pô que saudades dali.
Dessa vez pegamos quartos separados, e nos instalamos e começamos uma peregrinação para achar meios de transportes para os nossos próximos destinos, perguntei em uma agencia próxima, e o cara falou que havia bus direto para Dharamsala mas eu não comprei porque queria ficar um tempo mais com Inci, ela por sua vez deixou para ver no dia seguinte a sua passagem de volta para Varanasi.
Rodamos por Rishikesh, fomos até as praias do rio onde muitos tomavam banho de sunga, mas quando coloquei o pé na agua já falei sem chance “gelaaaaada mas curtimos estar ali naquele lindo dia de sol, depois paramos em um cara na rua que fez uma tattoo de hena na Inci, estilo aquelas de noivas indianas, muito bonito! Rodamos um pouco mais e descobrimos o que seria um de nossos lugares preferidos em Rishikesh, o Coffe Day; um Café com uma decoração ocidental e poltronas confortáveis, e assim paramos para um rápido café. Perto das 18:00 rumamos para a cerimônia que aconteceria em um ghat em frente ao rio, e chegamos lá... pessoal, sou cristão, creio e muito em Deus, sempre agradeço e proteção nessa viagem; mas o jeito que os caras fazem o ritual deles é de tirar o chapéu por conta da simplicidade. Imagina uma escadaria que desce até o rio onde tem uma estatua de Shiva gigante. Você simplesmente chega e senta no chão ou nos degraus e assiste a cerim��nia, onde há vários instrumentos tocando e várias vozes cantando (lembram do Hare Krishna), então o sol vai se pondo e você está em um vale envolto por montanha verdejantes e água do rio correndo ao seu lado (no meu caso eu estava com os pés dentro d’água sentado na escadaria de mármore). O que quero dizer é que em muitas religiões principalmente no cristianismo há muita gente se perdendo confundindo adoração com sucesso, quantas vezes você vê em uma igreja acabar o culto ou a missa e todo mundo fazer uma roda em torno dos músicos, dos cantores do pastor ou do padre. Isso que achei interessante aqui, por exemplo quando o guru chegou todos respeitosamente se levantaram e ele sentou-se no meio do povo e fez parte da celebração, acabou, ele simplesmente levantou e saiu, assim como os músicos sem espaço para vaidades, para receber cumprimentos ou uma suposta ‘adoração’, foi deu a sua mensagem e saiu com simplicidade. Pois é, isso tudo é uma questão de opinião, mas a minha intenção não é levantar esse tipo de discussão, andiamo con nostro relato!
Já era noite quando acabou a celebração e rumamos ao Coffe Day para mais um café com donuts e conhecemos o Robert, um senhor alemão muito gente boa que ganha vida trazendo carros encomendados da Alemanha para o Oriente Médio, esse cara valia sempre uma boa conversa, falávamos sobre futebol, criquet, Alemanha, Brasil e Turquia, quando havíamos ido a tarde reparamos nesse senhor alemão pois havia nos cumprimentado educadamente, agora mostrava mais ainda ser um cara fantástico.
Ficamos ali um bom tempo e logo rumamos ao hotel, onde ficamos conversando no quarto de Inci e quando bateu o sono rumei para a minha cama.